O ateliê

Poderia eu construir minhas próprias pontes sem as pontes do lado de fora da cidade? poderia eu pintar os tetos da igreja sem uma escada que sustentasse as histórias e pretensões dos artistas que nasceram e morreram antes de mim? eles podem ter pintado os tetos de todas as igrejas da cidade, mas agora que estou aqui também deram o pincel pra eu pintar. A cidade de antes teve muitos anjos, teve muitos demônios, muitos julgados e muitos heróis, depois pode ter mais. As paredes de casa são brancas como a dos outros moradores, com o tempo algumas podem ficar do mesmo jeito, outras cheias de pinturas. Pode haver muitas igrejas ao mesmo tempo sendo pintadas, mas quando as janelas estão fechadas a sensação é que haja apenas a da minha casa.

Poderia eu ser um grande rei apenas com minha coroa quando há muitos outros com coroas também? podemos ter um ateliê bagunçado e em contante inspiração, só que lá fora há tantos outros ateliês que os juízes precisam dar conta da organização. Talvez as flores que cultivo, o vizinho também cultiva e seu bisavô também cultivava. Talvez as histórias que ele carrega tá guardada dentro do ateliê dele num quadro encapado em baixo da cama.  Há tantas cores, há tantas técnicas, há tantas inspirações que vem e vão. Dramas, romances, comédias, tragédias a todo instante nas pinceladas emocionadas. Algumas pinturas a rodar mundo, outras que estão em casa.

Quando se abre a janela do ateliê, pode-se ver as inúmeras pinturas dos tetos, dos muros, dos prédios e dos subterrâneos - os que perambulam também, dos artista que se foram, dos que estão e dos que virão. Ser inspirado e inspirar outros, quando a janela do ateliê está fechada fico concentrado só na minha pintura.


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